quinta-feira, 19 de julho de 2018

Efervescência do Espírito


Há poucos dias, depois de celebrarmos a Ascensão do Senhor, celebramos a festa de Pentecostes. O referencial maior de Pentecostes nos é narrado no segundo capítulo do livro dos Atos dos Apóstolos. O medo é vencido, a presença de Deus se manifesta nos simples, há um novo ardor para o anúncio de Jesus, uma universalidade que se dirige e atinge a todos. No meio do povo percebe-se a manifestação sensível da ação de Deus na história. O desenrolar dos acontecimentos vai notificando que o Espírito não age apenas na vida das pessoas e na Igreja. O Espírito age na história, não se cansa e não se deixa aprisionar, como bem tem enfatizado em seus escritos o Pe. Victor Codina, teólogo catalão radicado na Bolívia. Sem uma busca de captar essa presença do Espírito, não conseguimos captar a densidade espiritual dos acontecimentos da história.
O Vaticano II foi um momento de efervescência do Espírito na nossa história. Dentro da Igreja, uma onda de movimentos como o movimento bíblico, o movimento litúrgico, o movimento ecumênico, do apostolado dos leigos, entre outros, criava um grande clima de esperança e de abertura ao diálogo com o mundo. Na sociedade, o avanço das ciências, as novas descobertas apontavam para um novo tempo na história. E, não havia como fechar-se a essa realidade. Isso foi captado pelo Papa João XXIII, pelos Padres Conciliares e possibilitou um verdadeiro Pentecostes na Igreja.
Talvez na recepção do Vaticano II pelo mundo afora, tenha faltado um pouco de coragem de deixar-se guiar pelo Espírito. Em muitos lugares, uma força de oposição foi-se levantando e emperrando as conquistas alcançadas no Concílio. Essas amarras também se fizeram presentes na América Latina. Mas o clamor do Espírito se fez ouvir pelo sofrimento do povo: as ditaduras militares tiravam a liberdade de expressão e aniquilava quem se opunha ao governo. A política econômica impunha-se sobre uma injustiça social que privilegiava a elite em troco da fome e da miséria da maioria da população. A dor e o sofrimento dos mais empobrecidos, o clamor do povo chegou aos bispos latinoamericanos que, a partir do Ver a realidade, buscaram luzes no Evangelho e chegaram a pistas de ação para Igreja.
Medellín foi um pentecostes na América Latina. Um acontecimento importante que precisa ser revisitado, não com saudosismo, mas como forma de captar a presença do Espírito de Deus na Igreja latinoamericana. Em Medellín nasce, ou melhor, renasce a Igreja dos pobres, aquela iniciada por Jesus. Em Medellín nasce um novo jeito de fazer teologia, um teologizar a partir de baixo, a partir da vida do povo, lugar onde age o Espírito de Deus. Em Medellín nasce um novo tipo de pastor, próximo do povo, sensível às suas dores, renasce uma Igreja participativa onde todos têm voz e vez, renascem os mártires da caminhada...
O Espírito aponta as realizações do Reino em nossa história e ilumina os passos para o verdadeiro seguimento de Jesus. A presença de Francisco na Igreja, nos aponta para a simplicidade do Evangelho, para uma Igreja em saída, acolhedora e misericordiosa. Os ventos do Espírito estão a soprar, oxalá nos liberte dos medos que amarram a Igreja, oxalá nos recobre o verdadeiro ardor missionário para que nossa presença no mundo na história, manifeste o amor universal de Deus quer vida em abundância para todos (Jo 10,10). Oxalá seja um novo pentecostes na vida da Igreja. E isso é pra começo de conversa.
Denilson Mariano


Editorial Revista O Lutador - Ed. 3900 - Junho de 2018

Nenhum comentário:

Postar um comentário